Discussão sobre setor nuclear em grupo de transição cria alerta de impacto na relação com a Marinha
Futuro de militares na máquina pública é desafio do governo Lula
POLÍTICA
A forte presença de militares na máquina administrativa federal – uma herança da gestão de Jair Bolsonaro (PL) – é vista por aliados do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como um dos principais desafios que o petista terá que enfrentar ainda na montagem de seu governo.
Anunciado para o Ministério da Defesa, o ex-ministro José Múcio Monteiro já admitiu a interlocutores que a retirada de militares de cargos do primeiro e segundo escalões será uma de suas tarefas mais delicadas.
O tema foi inclusive abordado por Múcio durante entrevista à GloboNews nesta sexta-feira (9).
“Não adianta esconder que tem muitos militares em cargos na Esplanada. Tem militares de todas as armas. O que eu disse é que a gente precisa voltar ao que éramos. No governo você tem substituições. Vamos ver como vai ser”, declarou futuro ministro.
Uma das áreas de interesse dos militares que já gerou atrito na transição é a das estatais que trabalham com tecnologia nuclear. Esse setor hoje está sob o guarda-chuva do Ministério de Minas e Energia, que teve seu organograma robustecido sob o comando do almirante Bento Albuquerque.
Em seu primeiro dia de governo, Bolsonaro publicou um decreto vinculando a Nuclep (Nuclebras Equipamentos Pesados) e a INB (Indústrias Nucleares do Brasil) ao Ministério de Minas e Energia. Até então, as duas estatais eram subordinadas ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
Hoje presidida pelo capitão de Mar e Guerra da reserva Carlos Freire Moreira, a INB detém monopólio de produção e comercialização de materiais nucleares. Atua na cadeia produtiva do urânio como combustível nuclear.
As Indústrias Nucleares do Brasil são grandes fornecedoras de equipamentos para a Marinha e há diversas parcerias estratégicas para o desenvolvimento de tecnologias entre a Força e a estatal.
Produtora de bens de capital sob encomenda, a Nuclep é, por sua vez, presidida pelo contra-almirante Carlos Henrique Silva Seixas.
A estatal foi criada em 1975, década em que a ditadura militar investiu no desenvolvimento de empresas do setor para atender ao Programa Nuclear Brasileiro.
Dentro do gabinete de transição do governo Lula, integrantes do grupo destinado à reestruturação do Ministério da Ciência e Tecnologia defendem que pelo menos uma das empresas -no caso a INB- seja reintegrada à pasta.
No grupo, não há consenso sobre o melhor destino para a Nuclep, hoje encarregada da construção de equipamentos pesados.
De tão delicado, o tema nem chegou a ser incluído no primeiro relatório do grupo chamado de Ciência, Tecnologia e Inovação. No entanto, o assunto foi debatido internamente. A intenção é que seja apresentado como proposta para os 100 primeiros dias do governo Lula.
Coordenador do gabinete de transição, o ex-ministro Aloizio Mercadante afirmou à Folha que o remanejamento seria uma precipitação. Segundo ele, a decisão não está no âmbito do grupo de trabalho de Ciência e Tecnologia.
Mercadante disse ainda que, se publicada, essa proposta seria desautorizada por prever uma mudança estrutural numa área sensível.
“Os GTs [grupos de trabalho] não têm mandato para mudanças dessa natureza, apenas para projetar os desafios dos primeiros 100 dias. Essa é uma proposta de mudança estrutural, que desconhecemos”, disse.
Almirantes consultados pela Folha consideram muito negativa uma possível mudança nas estatais do setor nuclear, com eventual saída de oficiais dos cargos de chefia. Três deles afirmaram reservadamente que, se a ideia for adiante, haverá um forte impacto na relação entre a Marinha e o futuro governo.
O principal receio está na possibilidade de que uma queda de braço entre o Ministério de Ciência e Tecnologia e o Ministério de Minas e Energia impacte a composição dos conselhos de administração e presidências dessas estatais.
Para eles, a mudança da Nuclep e do INB para a pasta de Minas e Energia ampliou a participação da Marinha no setor e alavancou pesquisas que foram importantes -por exemplo, para o desenvolvimento de submarinos de propulsão nuclear.
Os almirantes, no entanto, não acreditam que serão afastados da discussão, já que foi no governo petista de Dilma Rousseff que houve avanços consideráveis na atuação da Marinha no setor nuclear. Eles citam a criação da estatal Amazônia Azul Tecnologias de Defesa como desdobramento do Programa Nuclear da Marinha e do Programa de Desenvolvimento de Submarinos.
Por outro lado, o almirantado avalia que declarações recentes de Lula e José Múcio apontam para uma priorização de projetos-chave para as Forças Armadas -hoje, Marinha e Exército investem fortemente em programas nucleares e de defesa cibernética, para atender às diretrizes estabelecidas na última versão da Estratégica Nacional de Defesa.
Em outra frente de desgaste, integrantes do grupo de trabalho da transição sugeriram que não sejam sabatinados pelo Senado diretores da recém-criada ANSN (Autoridade Nacional de Segurança Nuclear). Eles já foram indicados por Bolsonaro.
Fruto do desmembramento da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear), a ANSN está vinculada ao Ministério das Minas e Energia. Integrantes do grupo de trabalho da transição defendem que suas funções também sejam assumidas pela Ciência e Tecnologia.
Outra recomendação é que o CBA (Centro de Biotecnologia da Amazônia) fique sob o guarda-chuva da Ciência e Tecnologia.
POLÍTICA
PlatôBR: Motta e o governo dependem de boa relação em outros temas
Mesmo com as divergências em torno do projeto contra as facções, que deve ser votado nesta terça-feira no plenário, o Planalto e o presidente da Câmara têm interesses que os aproximam na política nacional e estadual
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Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Apesar dos recentes abalos de confiança, o entendimento no Palácio do Planalto é que será preciso manter a boa relação com o presidente da Câmara, Hugo Motta(Republicanos-PB), até o ano que vem. A cautela tem razões pragmáticas: o governo depende da aprovação pelo Congresso de projetos que aumentam a arrecadação de 2026.
A divergência mais recente foi provocada pela decisão de Motta de escolher o deputado Guilherme Derrite (PP-SP) para relatar o PL Antifacção, proposto originalmente pelo Planalto. Ao entregar o texto a um parlamentar da oposição, Motta tirou das mãos do governo uma das principais propostas para o combate à criminalidade, tema sensível para as eleições de 2026.
Aliado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Derrite ocupava até duas semanas atrás o cargo secretário de Segurança Pública do estado e deixou o posto para assumir a relatoria do projeto. Provável candidato à Presidência da República no ano que vem, Tarcísio desponta como um dos nomes mais fortes para enfrentar Lula. O gesto de Motta tirou o protagonismo do petista nessa proposta.
Motta pretende colocar o PL Antifacção em votação nesta terça-feira, 18. O governo trabalha para adiar a decisão da Câmara sobre o projeto, mas para isso depende do presidente da Câmara. Um último esforço para tentar evitar que o texto seja levado ao plenário será feito nesta manhã pelos ministros Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), que terão reunião com Motta para tentar evitar uma derrota nessa votação. O Planalto trabalha contra a tentativa de Derrite de tirar verbas da Polícia Federal e, também, quer impedir aprovação da proposta que equipara facções criminosas a organizações terroristas.
Fora da discussão da segurança pública, pelo menos três matérias com impacto na arrecadação dependerão de Motta para que sejam apreciadas até o fim do ano. Uma delas é o projeto de lei 5.473/2025, sobre aumento de tributação de bets, bancos e fintechs. Essa proposta também tem previsão para ser votada nesta terça-feira, 18, na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado, onde tramita em caráter terminativo. Se aprovada nessa fase, vai direto para a Câmara.
Outra proposta de interesse do Planalto em tramitação na Câmara é projeto de lei complementar nº 182/25, que prevê o corte linear de 10% de benefícios fiscais para setores da economia. Este projeto está sob análise da CFT (Comissão de Finanças e Tributação) e teve a votação adiada na semana passada por um pedido de vista.
A terceira proposta que impacta o orçamento e que deixa o governo dependente de Motta é o PLP 125/22, conhecido como projeto dos “devedores contumazes”. Além de fazer parte do pacote de enfrentamento ao crime organizado, essa proposta também contribui para a arrecadação do governo. De autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o texto já foi aprovado pelo Senado. Sobre essa proposta, Gleisi pediu a Motta que a tramitação não seja atrapalhada pelas discussões acirradas em torno do PL Antifacção.
Por outro lado
O presidente da Câmara também tem interesse em não romper com o governo, embora seja aliado da oposição em assuntos que contrariam o Planalto, caso do aumento das alíquotas do IOF, que foi derrubado pela Câmara. Na política estadual, Motta quer o apoio explícito de Lula para a candidatura ao Senado de seu pai, Nabor Wanderley, atual prefeito de Patos (PB).
Motta também trabalha para renovar o mandato de deputado e, se possível, se reeleger presidente da Câmara em 2027. Para concretizar esses planos, ele precisa se equilibrar entre o governo e a oposição para tentar repetir o amplo leque de alianças que o levou ao cargo no ano passado. Com esse objetivo, ele por vezes agrada à oposição e contraria o governo, ou vice-versa.
Outros fatores aproximam Motta do Planalto. Após a devassa feita na Esplanada contra os infiéis do União Brasil e do PP, o governo deu a Motta a oportunidade de fazer indicações para cargos no segundo e no terceiro escalão, incluindo ministérios, autarquias e estatais. A indicação de Derrite, segundo interlocutores do Planalto, acabou suspendendo esse movimento. Vem daí a surpresa do Planalto, pois o presidente da Câmara chegou a participar de reuniões com o governo para definir a recomposição dos cargos com as bancadas de deputados.
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